Fonte: A GAZETA, 13/11/2011, p.37
O polo gás-químico de Linhares (ou UFN-IV, segundo denominação da Petrobrás) esteve muito perto de se tornar uma realidade em 2015, entretanto uma série de eventos ligados à conjuntura política da época, e desconhecidos até então, foram revelados a posteriori . Projetos foram redefinidos como insustentáveis e por fim, abortados.
Para entender essa trágica conjuntura, recomendo a leitura do livro “A Organização”, da jornalista Malu Gaspar. Esta obra não aborda diretamente a cadeia de eventos que culminaram com o encerramento abrupto do polo gás-químico de Linhares, mas permite compreender o contexto da época em que esse projeto se desenvolveu (https://www.amazon.com.br/organiza%C3%A7%C3%A3o-Odebrecht-esquema-corrup%C3%A7%C3%A3o-chocou-ebook/dp/B08LR1VRZR).
Mas enfim, de que se tratava esse projeto afinal e qual sua importância para Linhares, o Espírito Santo e o país ?
Verificando uma publicação da época, A_TRIBUNA_2012 , pode se ter boa dimensão da importância deste projeto e como ainda se mantém atual.
Além disso, um infográfico produzido pelo jornal A GAZETA em 2011, e que abre esta apresentação, resumiu bem este magnífico projeto, permitindo rápida compreensão que o gás natural – riqueza natural em que o ES figura como segundo maior produtor do país, com uma produção de quase 10 milhões de metros cúbicos por dia (dados de 2018, segundo https://portaldaindustria-es.com.br/system/repositories/files/000/000/080/original/FEC_marco_2018.pdf?1550691159 ) , tem uso mais nobre do que somente seu uso combustível.
Torna-se portanto imperativo seu beneficiamento, agregando valor com a produção primária de amônea e posteriormente uréia, além de metanol (ou álcool metílico).
A uréia, é reconhecidamente um importante fertilizante (e vital para o agronegócio brasileiro), possuindo 46 % de nitrogênio em sua estrutura molecular. É importada em grande quantidade (tendo superado a marca de 1 bilhão de dólares em 2020), conforme o gráfico abaixo:
Fonte: https://blog.logcomex.com/importacao-de-ureia-agricola-ultimos-12-meses/, acesso em 08/07/2021
Desta forma se explica a concepção do projeto, que em 2009 planejou a produção de 763 mil toneladas de uréia por ano.
Apesar desta quantidade ser expressiva, está abaixo do que foi importado em 2020 (aproximadamente quase 7 milhões de toneladas, segundo https://www.globalfert.com.br/analises/importacao-de-fertilizantes-bate-recorde-em-2020/ ).
Sendo assim, a produção de uréia em Linhares – de pelo menos 1 milhão de toneladas/ano – através do gás natural, se torna atividade estratégica para o agronegócio brasileiro.
Uma observação relevante é a possibilidade de produção de melamina (não confundir com melanina, pigmento da pele), que apesar de possuir amplo espectro de aplicações, possui significado especial para Linhares (que possui significativo polo moveleiro), por permitir agregar valor à confecção de placas de MDF (placa de fibra de madeira de média densidade), por sua função adesiva.
Uma fábrica de placas de MDF em Pinheiros (norte do ES), recentemente implantada, seria beneficiada com acesso à esse insumo, permitindo significativa redução de seu custo operacional já que sua única opção é adquirir este produto por importação ou de fornecedores do sul do país.
Sobre esta empresa, vale a pena conhecer um pouco mais acessando https://placasdobrasil.com.br/placas-do-brasil-dispoe-da-tecnologia-mais-moderna-do-pais/
Merece destaque também a possibilidade produção de metanol (ou álcool metílico) a partir do gás natural.
Apesar de ser extremamente tóxico ao homem, tem enorme importância na atividade industrial pelo seu uso como matéria prima e intermediário químico para síntese de diversos compostos, como por exemplo, o ácido acético e o ácido fórmico.
Um resumo de sua importância pode ser visualizado no quadro abaixo.
Fonte: https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/Documents/EPE-DEA-IT-05-19%20-%20GN_Metanol%20(002).pdf, acesso em 09/07/2021
Este importante produto da indústria química não é produzido no país desde 2016, sendo atualmente importado.
Fonte: https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/Documents/EPE-DEA-IT-05-19%20-%20GN_Metanol%20(002).pdf, acesso em 09/07/2021
Sendo assim, a produção de metanol no polo gás químico de Linhares poderia atender quase que toda a demanda nacional deste produto.
Pelo pouco que foi exposto, creio que existem bons motivos para se retomar o debate pela recuperação deste projeto. É sabido que a Petrobrás não manifesta mais interesse em retomar projetos dessa natureza, preferindo estrategicamente se ocupar da exploração e produção de óleo e gás natural, não atuando mais no seu beneficiamento.
Isso abre amplas perspectivas para o setor privado, pois a existência de demanda para a uréia e o metanol estão bem definidas.
Em reforço à tese de que Linhares é um candidato natural para a instalação de um polo gás-químico (lembrando da existencia de uma unidade que a ela poderia ser integrada, a unidade de tratamento de gás, em Cacimbas), tem se a consolidação deste município como polo logístico, por sua localização geográfica e acesso aos incentivos fiscais da Sudene. Tal fato permitiu a atração de significativos empreendimentos industriais como fábricas de café solúvel, torres metálicas, motores, indústrias de alimentos, eletrodomésticos, consolidando uma notável diversificação de seu parque industrial.
Inclua-se neste quesito a implantação recente (com início de suas obras em 2021) de um porto privado em Aracruz, distante cerca de 70 km, que possibilitará a aglutinação de um cluster industrial em seu entorno e ampliação de rotas logísticas para as indústrias localizadas em Linhares.
Comentei o fim deste projeto em 2015, sendo o texto ainda atual, conforme acesso em :
texto_polo_linhares_correiodoestado.pdf
Para melhor conhecimento deste fabuloso projeto, pode ser conferido sua versão oficial através de :
Petrobrás Apresentação Julho 2012
Em conclusão, penso que a exemplo da questão da salgema, deve este tema ocupar o debate político do Espírito Santo, por se tratar do beneficiamento de uma riqueza natural que coincide com a vocação logística do estado, permitindo gerar inúmeras cadeias de valor, com emprego de qualidade e renda.